Não
é de admirar, de facto, que a grande maioria da humanidade civilizada seja
mentalmente provinciana, porque o urbanismo mental é mais difícil de se
estabelecer que o geográfico (geodético). O que porém será de admirar é se
formos encontrar os sintomas de provincianismo entre a minoria, entre o escol e
o escol do escol.
Se,
assim, em grande número de nações há um provincianismo geral do escol, sucede
que, naquelas em que tal se não dá assim, continua a dar-se, de outro modo.
Aqui é o escol inteiro, em suas três camadas, ou duas, que manifesta o
provincianismo. Ali é a maioria do escol, por ter perdido a capacidade de
absorver as ideias emanadas do escol menor.
Nos
tempos da Renascença, como, precedentemente, nos da Idade Média, uma doutrina
superior não tardava em ser conhecida, e, onde não fosse adoptada, pelo menos
rejeitada criticamente. Agora, uma doutrina superior dificilmente passa para as
camadas cultas, e, quando ali chega, chega como o equusdo epigrama
francês — mudou bastante no caminho.
Repare-se no que, em todos os povos do mundo, se passa
em matéria de doutrina política. A política prática continua a correr nas
mesmas calhas, ou em calhas quase as mesmas. No entanto fervilham doutrinas
críticas da política, com que ninguém na prática se importa. Tudo quanto se tem
feito recentemente de alterações nas constituições ou leis fundamentais, são
expedientes da política acidental, movimentos do oportunismo — nunca a
aplicação de princípios críticos, de doutrinas sociológicas.
s.d.
Ultimatum e Páginas de Sociologia
Política. Fernando Pessoa. (Recolha de
textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Morão. Introdução e organização de
Joel Serrão.) Lisboa: Ática, 1980.
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